quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Uma outra visão das revoltas na Europa e no mundo.

O Brasil, assim como qualquer outro país “emergente” tem o sonho de se tornar uma nação “desenvolvida” ou uma “potência” assim como os EUA e os países da Europa Ocidental. Afinal, estes são "modelos de sociedades organizadas", de "pessoas civilizadas", de "ordem e progresso", capazes de envergonhar países subdesenvolvidos, que “não vão para frente” por culpa de um povo "não afeito ao trabalho e a disciplina".

Esta concepção de desenvolvimento está tão impregnada no imaginário social de forma que transcende os limites do senso comum e passa a ser reproduzida inclusive por pessoas “estudadas”, nos bancos universitários. Alguns jovens, por isso, passam a sonhar em viajar ou viver nesses países-modelo, desfrutar do glamour de estar na Europa e dos prazeres possibilitados por tecnologias super avançadas, que não são vistas por aqui.

Porém, como compreender, dentro dessa lógica, fenômenos como os que estão ocorrendo na Inglaterra hoje, onde milhares de “baderneiros” (como os classifica a mídia) estão saindo às ruas, destruindo e ateando fogo em estabelecimentos comerciais? Afinal, como pode isso existir em um país de primeiro mundo, símbolo do desenvolvimento? Revoltas e desordens como essas não acontecem apenas nos regimes “anárquicos” do terceiro mundo?

Prontamente, os letrados e a mídia (que também incute na mente do povo o modelo de sociedade desenvolvida acima referido) apresentam a resposta mágica: São delinqüentes, bandidos, criminosos que saem às ruas destruindo tudo por puro prazer em delinqüir, em função apenas de sua personalidade agressiva e criminosa. Afinal, quais outros motivos teriam para justificar seus atos? Como podem estar insatisfeitos com algo, se vivem em um país no qual todo o resto do mundo gostaria de viver?

Portanto, a solução é, para eles, a repressão policial e a prisão para todos esses marginais que ameaçam a ordem estabelecida.

Quando ouço imbecilidades desse tipo, tanto de pessoas ao redor como nos telejornais (principalmente nos da rede globo), sinto repugnância e desprezo. É óbvio que para alguns, esta forma de justificar os fatos é conveniente, pois têm interesse na manutenção de um sistema do qual se beneficiam. Porém, para outros, que não possuem interesse direto no sistema ou que mesmo só são prejudicados por ele, é acima de tudo uma expressão da burrice de quem não consegue ver o obvio!

Se todos os manifestantes europeus são criminosos, então a Inglaterra, a Espanha, a França, países desenvolvidos, modelos para o resto do mundo, estão produzindo criminosos? Como explicar isto?

É incrível a dificuldade que alguns têm em perceber (ou não querem mesmo) que as revoltas sociais a que estamos assistindo, não só na Inglaterra, mas também em diversos outros países europeus e latino-americanos, são fruto de um sistema político-econômico perverso que produz profundas desigualdades sociais. E isso não ocorre apenas na Europa, nos EUA, ou nos países Asiáticos, mas no mundo inteiro que, hoje, faz parte deste sistema.

É fácil justificar os acontecimentos dizendo que os rebeldes são pessoas que não trabalham, que não estudam, vivem sustentados pelo governo e ainda querem mais regalia. Porém, como trabalhar aonde não há trabalho para todos e como estudar aonde o acesso à escola e às universidades é para poucos?

Indignar-se e rebelar-se contra opressões e injustiças sociais é da natureza humana. Criminalizar as manifestações é a maneira com que o sistema age para reprimir aquilo que ele próprio produz.

Márcio Brum

Um comentário:

  1. Fico extremamente feliz em ver um DLD atuante como este parece ser! Infelizmente, essa posição crítica e consciente não é algo comum no curso de direito da UFSM - e, pelo o que eu tenho visto, em muitas outras universidades: especial e principalmente pelos professores! Saúde e vida longa a um Diretório de Curso de Direito da UFSM que parece ter ACORDADO!
    Abraços!!

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